Procure seu Chefe

 Durante o tempo que passei no Campo de Provas da Marambaia (1979-1981) uma situação me incomodava demais.  O responsável pelo meu grupo, ou seja, o meu chefe o Tenente-Coronel Asdrúbal (* nome fictício) quase não ficava no local.  Havia um grupo de 3 Kombis que eram de uma empresa contratada para nos transportar ida e volta ao trabalho.  Asdrúbal chegava em uma das Kombis e pouco depois saía com a mesma Kombi e só voltava na hora do almoço.  As vezes só no fim do expediente.

Fiquei então sabendo o motivo, através dos motoristas da Kombi.  Asdrúbal estava construindo uma casa em um terreno próximo da Restinga.  Ele usava o tempo do seu expediente para supervisionar e orientar a obra e, frequentemente as Kombis para transportar material de construção para lá (o contrato das Kombis não era pra isso).  Eu não conseguia aceitar a idéia de que aquele que deveria ser meu exemplo e fiscalizar o meu trabalho pudesse ter uma atitude tão venal e descarada.

Muito embora ele não se envolvesse em aspectos técnicos e sim administrativos, sua ausência acabava por atrapalhar o andamento das atividades, além de servir de chacota e desmoralizar o ambiente.  Até que me enchi de razão e fui relatar o que estava acontecendo com o chefe do grupo de foguetes, o Coronel Hefesto (*nome fictício).  Procurei ser o mais ético possível ao relatar fatos e não a interpretação dos mesmos.  Hefesto me ouviu com atenção e então respondeu:  Se você tem alguma reclamação a fazer, procure o seu chefe!

Nesses momentos, parece que algo desperta dentro de mim.  Repliquei de imediato:  O meu chefe é o problema que quero reclamar, como posso relatar um problema ao próprio problema?  Hefesto, se virou e foi embora sem responder.

Fiquei preocupado em vir a ser demitido em função disso, mas nada aconteceu.  Depois eu entendi o porquê.  Hesfeto já sabia de tudo e fazia vista grossa.  Não apenas nas atitudes de Asdrúbal mas também de muitos outros.  De repente eu percebi que ele era o principal responsável por tudo que estava acontecendo, não por ação mas por omissão.  Estava usando a hierarquia para fugir da responsabilidade.

Como dizia um saudoso colega de trabalho Dr. Paulo Moraes Jr. (a quem honro aqui pela seriedade e caráter) “todo chefe sabe o RG e o CPF dos malfeitores”.  Se não age ou é porque está conivente ou mesmo parte do esquema ou é impedido pelo seu superior.

Nem sei dizer quantos Hesfetos encontrei pelo caminho fazendo vista grossa para as picaretagens de Asdrúbals.  Mas sei que é esse tipo de atitude, de usar de formalidades para impedir ou desculpar ações efetivas contra torpeza, a causa de muitos males em nossa sociedade. 

Eu gostaria de dizer a Hefesto hoje: eu fiz a minha parte, você não fez a sua!  Quero sempre fazer parte da solução, jamais do problema.

Comentários

  1. Nossa pela sua época de registro de memórias me fez lembra quando comecei a trabalhar no Aeroporto Marechal Rondon eu trabalhava na operação na sala de trafego aéreo ccm, contratada de uma empresa vinculada a aeronáutica, e andava em uma kombi também, foi uma aventura incrivel, gostava de ver os teste de mirragem aterrisar nas pista de pouso, foi muito interessante, essa época a empresa era INFRAERO. Mas sempre tinha medo de procurar meu chefe, por qualquer motivo e tinha medo de inquérito administrativo. Depois fui para Brasilia trabalhar na Sede da Empresa , Trabalhava na secretaria da Presidência com Brigadeiro Helio Costa, foi uma grande experiência o que me chamava atenção era um pendulo que ele usava em sua mesa mas nunca tive coragem de perguntar para que servia.

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