Critério Estético
Em 1980, estávamos estudando o lançamento de foguetes que eram feitos de uma rampa instalada no Campo de Provas da Marambaia. Percebemos que, apesar de ser lançado sempre do mesmo ângulo, as trajetórias dos foguetes tinham uma dispersão anormal.
Decidiu-se, então, fazer uma
filmagem rápida do momento do lançamento para saber qual efeito perturbador
estava acontecendo durante a largada da rampa.
Dito e feito, o filme mostrou que o foguete, ao se desprender da rampa,
sofria uma pequena “queda” antes de continuar sua trajetória. Conclui-se, com isso, que a rampa era curta
demais para oferecer a estabilidade aerodinâmica que o foguete necessitava.
Imediatamente se fez a
pergunta: porque a rampa tem aquele comprimento? Rapidamente soubemos que se tratava de um projeto
de graduação da turma de engenharia mecânica de armamento de alguns anos antes. Procurou-se, então, seus projetistas e lhes
questionamos o porquê do tamanho daquela rampa.
A resposta foi surpreendente – era para que terminasse junto com a ponta
do foguete por ser mais estético.
Um critério estético? Achei aquilo um absurdo e, na época, foi
motivo de piada e zombaria. Entretanto,
a maturidade me trouxe uma visão bem diferente do episódio. Tratava-se de um projeto de graduação feito,
portanto, por estudantes. Se não
conheciam outro critério para estabelecer o comprimento da rampa, usaram o que
tinham à mão. A pergunta fundamental é:
onde estava seu orientador? Se houve um
erro crasso por uso de uma especificação ridícula, a responsabilidade não era
dos aprendizes e sim de seu orientador.
Ao longo de minha carreira me
deparei com diversos casos semelhantes.
Trabalhos de graduação, dissertações de mestrado e até teses de
doutorado com conteúdos esdrúxulos e equivocados, advindos da falta de
orientação. Isso me trouxe uma grande lição,
que ajudou em tudo que fiz a partir daquele dia.
Em 1987, fui participar de uma
banca de trabalho de graduação e percebi que o mesmo estava completamente
errado. No dia da apresentação, o
aluno me encontrou fora da sala e perguntou: e então mestre, gostou do trabalho? Chamei-o à parte e lhe fui bem direto: seu trabalho está reprovado, mas não se
assuste, sei que a culpa não é sua e sim do seu orientador (que não fazia parte
da banca). Ele, obviamente, ficou
bastante nervoso e procurei acalmá-lo me comprometendo a ajudar. Ele teria 2 meses para refazer o trabalho e
reapresentar.
Passei as próximas semanas
indo na Faculdade apenas para me encontrá-lo.
Mostrei para ele tudo o que estava errado e como seria o certo. Ele demonstrou muito valor pessoal, pois
reescreveu completamente o trabalho em 2 meses e o reapresentou, sendo
aprovado. Posteriormente, fiquei gratamente surpreso quando recebi a versão
final do trabalho. Ele havia substituído
o nome do orientador pelo meu.
O seu nome também consta do meu trabalho de graduação, uma honra, uma satisfação muito grande...
ResponderExcluirE sou grata pela franqueza de sempre... lembro que passei o dia inteiro pra escrever meia página, era o início da tese... e no fim do dia, quando submeti aquela meia página pra sua avaliação...
Caneta vermelha em quase tudo, e a pergunta... "quer usar de rascunho, ou posso jogar fora?"
Alguns ficariam abatidos, pensariam em desistir... eu usei como crítica construtiva... de fato, tinha muito a melhorar, e melhorou.... a nota do trabalho? 10 com louvor! Gratidão infinita Mestre!
Realmente uma grande lição para vida!
ResponderExcluirEu passei por algo parecido que um acadêmico em TCC de conclusão de curso de engenharia mecânica, teve seu trabalho rejeitado e sofreu represálias do seu orientador na banca na qual eu era dos integrantes como avaliador.
O projeto seria uma máquina de fazer chá Instantâneo com cinco sabores.
Eu não reprovei o trabalho, pois sabia que tinha falhas passíveis de corrigir e o acadêmico tinha dificuldade em escrita e fala por ser de origem Venezuelano.
Certo que ouve negligência do orientador.
O Jovem me interpelou se eu poderia ser o orientador e assim concordei desde que não houvesse problema com o anterior.
Foram aceitas as permutas e passei a orientador e tivemos 30 dias para as correções estruturais e escritas. Isso deu-se em 2010 e logo a seguir foi lançado no mercado nacional algo semelhante. O nome dado no TCC era Chaiteria!
Orientação é compromisso. Muitos orientadores se furtam do seu papel, infelizmente!
Gostei mais dos ensinamentos da historia do que a própria historia em si. Fico muito feliz por compartilhar esses ensinamentos.
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