Doação Indesejada
Esse episódio veio do leitor deste blog, que se identifica como “um pesquisador brasileiro”. A história é completamente semelhante às vividas por mim. Incentivo aos leitores que quiserem contribuir que mandem os seus “causos”.
Quando
fui pesquisador na universidade pública republicana dos pinheirais (UPRP), por
dois anos também fui professor substituto, totalizando uma jornada de
extenuantes 77,5h de trabalho por semana. O trabalho de pesquisador era prazeroso e
flexível, nada que não estivesse acostumado a fazer desde os tempos de
doutorado. Por outro lado, ao assumir o cargo de professor, fui apresentado a
um lado da docência que ainda não conhecia: as reuniões de departamento. Eu
sabia que no departamento que estava alocado havia algumas rixas, mas o que eu estava
vendo era surreal e desanimador. Professores doutores, bolsistas de pesquisa do
órgão nacional de pesquisas praticamente indo às vias de fato por qualquer
quirera de recurso – por sinal, até abundante na UPRP.
Passado
o susto inicial, ministrei o primeiro semestre de aulas sem maiores problemas
e, sem ser incomodado, inclusive implantei algumas mudanças no estilo de
ministrar aulas que a meu ver só trariam benefícios aos alunos. Ao longo desse semestre, também ajudei uma
mestranda brilhante (chamarei de Maria) que trabalhava na fábrica de carros
“Luxo Sob Rodas”. Era uma aluna talentosa, que trabalhava em um setor
estratégico da empresa, mas que tinha uma séria dificuldade em escrita e na
interpretação dos resultados por não estar familiarizada com a técnica que
estava trabalhando.
Pois
bem. Maria defendeu seu mestrado com excelentes resultados e, como gratidão,
perguntou se eu não gostaria de uma doação de alguns motores para o laboratório
da UPRP, pois ela conseguiria com facilidade. Eu prontamente aceitei e levei o
ofício de doação ao chefe para a próxima reunião de departamento. Afinal, os motores do laboratório que eram
usados pelos alunos estavam caindo aos pedaços.
Chegado
o dia da reunião, assunto posto em pauta, o professor “dono do laboratório”,
que eu nem conhecia, haja visto sua (baixa) assiduidade na UPRP, pede a palavra
e faz um discurso inflamado cujo tema era “o absurdo que era um reles professor
substituto querer se meter no laboratório dele”. Afinal, “Quem é você para conseguir uma
doação?”. Resumo da ópera bufa, a doação não foi aceita sob o pretexto de que
era necessário uma licitação para (pasme!) receber os motores.
Aquela
noite foi difícil e tive que ligar para Maria e explicar que não poderia
receber os motores. Agradeci e sugeri que fossem doados a outra instituição que
pudesse fazer bom uso deles, onde lá estão até hoje. Na reunião seguinte, como “punição”, minha
carga horária em sala de aula saiu das 8h máximas pela legislação, para 16h,
sendo que 8h continuariam em nome de outro professor que “precisava naquele
momento que eu o substituísse” (apenas do começo ao fim do semestre, pouco
tempo). Minha lição (se é que dá para chamar assim), é que eu não deveria
invadir “feudos” de outros professores, ainda que fosse com doações.
Quando penso que já tinha
visto todo tipo de idiotice me aparece Licitação para Doação. Esse tipo de gente é uma espécie de verme que
vive às custas do organismo em que está instalado. Não produz e ainda impede os que querem
fazê-lo. Se quisermos ser um país sério
precisamos reagir a esse tipo de situação.
O melhor vermífugo é a denúncia formal e pública.
Interesses individuais se colocando acima do coletivo! Triste mas comum!
ResponderExcluirSinto que passei pela mesma situação, só que em menor grau. Enfim, nem sinto falta daquele ambiente. Ainda bem que saí de lá.
ResponderExcluirEngraçado que esse lugar deve ser uma baderna, pois um professor que mal aparecia na instituição ainda ter moral para ter esse tipo de atitude é porque o chefe dele deve ser um banana.
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