Campeonato Imaginário
Já corria o ano de 1984, o projeto ATTMM havia se mudado para o CTEx em Guaratiba, para um prédio especificado e construído para nós. Equipamentos caros e sofisticados haviam sido adquiridos. Ainda assim o projeto não tinha rumo. Não sabíamos o que realmente estávamos fazendo ali. Os próprios objetivos do projeto eram tão vagos que poderíamos propor qualquer coisa. Entretanto, nada era definido.
Eu já estava fazendo os
créditos do doutoramento e ganhando maturidade profissional para
saber que algo estava muito errado. Na
verdade estava farto de ver tantas coisas estranhas e algumas absurdas
(relatadas nos posts anteriores). Me
sentia um inútil enxugando gelo.
Resolvendo os problemas que eu mesmo criava.
Foi então que procurei meu
chefe, a quem eu respeitava muito (havia sido meu professor tanto na graduação
quanto no mestrado) e lhe expus claramente minha insatisfação com o que estava
acontecendo ao meu redor. Como tinha uma
intimidade respeitosa com ele, perguntei-lhe sem rodeios: O que estamos fazendo aqui ??
Sua resposta foi uma frase
pronta: Estamos nos preparando para, o
dia que o Exército precisar de nós, estarmos prontos!! Esse jargão é bastante apropriado para o ambiente
militar. Afinal, ninguém deseja a guerra
mas precisamos estar prontos para ela.
Acontece que para a pesquisa e
desenvolvimento não faz o mínimo sentido.
Fiquei indignado com a resposta.
Ela dizia claramente que ele, de fato, não sabia onde queria chegar,
muito menos como. As atividades aproximavam-se
da terapia ocupacional.
Imediatamente criei uma
ilustração para traduzir o que ele estava dizendo. Coronel, disse eu, isso é equivalente a um
prefeito de uma cidade do interior que decide formar um time de futebol. Ele constrói um campo, coloca traves com
redes, compra umas bolas, contrata um bando de jogadores e os coloca a
treinar. Quando perguntam quando será o
primeiro jogo, o prefeito responde: não existe nenhum campeonato, mas o dia que
houver um, estaremos prontos.
Com isso eu estava deixando
claro que não é possível motivar as pessoas para trabalhar em um projeto
assim. Qual seria a motivação das
pessoas que sabiam que o que faziam não teria nenhuma serventia ? Quem iria se motivar a treinar para um campeonato
imaginário ??
Nos anos que se seguiram, eu
já havia me mudado pra São José dos Campos e tudo era muito diferente. Havia, de fato, um grande projeto real - a
MECB (missão espacial completa brasileira).
Trabalhava no SONDA IV que qualificava os motores e outras tecnologias
para o VLS (Veículo Lançador de Satélites).
As atividades tinham pé e cabeça.
Faziam sentido.
Infelizmente, o tempo foi
passando e fomos, paulatinamente, perdendo o objetivo. Quando me aposentei, tinha certeza de que
estava novamente participando de um campeonato imaginário.
Os motivos disso serão
abordados em posts futuros. Por hora é
fundamental saber que não precisa ser assim.
Campeonatos imaginários devem ser encerrados imediatamente e seus responsáveis
expostos. É sim possível realizar projetos
sérios no Brasil. Precisamos das pessoas
certas nos lugares certos.
Uma pena o setor espacial não ter ao menos mantido o ritmo de outras épocas. Espero que esse cenário mude. Quem sabe com a iniciativa privada...
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