Convicção versus Conveniência

 No final de 1984 eu estava designado para outro curso de treinamento na EAI (Electronic Associates Inc.), o primeiro tinha sido em 1983 (post Viagem ao Exterior I).  Entretanto, eu já estava determinado em sair do instituto.  Estava claro para mim o que significavam os problemas que eu observava.  Não se tratava especificamente da ação de uma pessoa mas toda uma cultura organizacional que não produziria nenhum resultado.  Eu já havia externado minhas observações a respeito e a resposta foi aquela mostrada no post Campeonato Imaginário.

Com a preocupação em ser ético e julgando que não seria apropriado ser mandado para uma missão que posteriormente não geraria fruto, procurei novamente o meu chefe Tenente Coronel Bernardo Severo (já falecido).  Lhe deixei claro que não pretendia mais continuar na organização e que já estava procurando emprego.

Fui surpreendido com a pergunta de Severo: “Waldemar, quanto você gostaria de ganhar para continuar trabalhando aqui?”  Quem não gostaria de ouvir uma pergunta dessas?  Entretanto, minha resposta foi imediata e fulminante: “Nenhum dinheiro me paga para continuar aqui pois não acredito mais no que faço.” 

Aquela resposta veio de fato do fundo da alma.  Muito embora o salário fosse muito baixo e me obrigasse a dar aulas à noite, não se tratava de valor financeiro.  Eu queria construir uma carreira que fosse digna e que me desse orgulho. Que produzisse algo para o meu país.  Não me deixaria atrair pelo canto de sereia de uma promessa de um salário mais alto para continuar em um lugar onde eu tinha certeza que não tinha nenhum futuro.

Sei que fui bastante duro naquele momento.  Sempre tive o maior respeito pelo Coronel Severo e continuamos amigos até seu falecimento.  Nunca conversamos sobre esse episódio.  Não sei o quê exatamente ele estava pensando ao fazer aquela pergunta.  Ele não tinha poderes para definir o meu salário que era tabelado pela FINEP.  Teria sido um blefe ?  Se foi, não deu certo.

Seis meses após essa conversa eu estava de malas prontas para trabalhar no então Instituto de Atividades Espaciais IAE, em São José dos Campos.

Hoje, olhando para trás, sinto orgulho da decisão tomada.  Foram momentos difíceis mas mudou toda minha vida para melhor.  Valorizo pessoas que tomam decisões baseados em suas convicções e não segundo conveniências.

Sempre que tenho oportunidade, ensino meus alunos que, todas as vezes que trocamos nossas convicções por conveniências do momento, estamos vendendo um pedacinho da nossa alma.  Ao final da vida descobriremos que não sabemos mais quem somos senão um amontoado de conveniências.

Comentários

  1. O crescimento tem que ser intencional, ninguém melhora por acidente. Esta frase de John Maxuel
    Certamente pode resumir em partes esta narrativa. Quando se acredita firmemente, com toda convicção naquilo que se quer tornar ou realizar, nenhuma outra alternativa por mais conveniente que seja, pode fazer mudar a escolha ou decisão tomada. Que bom que sua escolha o tornou quem hoje você é.

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  2. Tive que tomar uma decisão parecida no inicio da minha carreira também. Eu era estagiário em uma empresa de mineração e seria contratado. Mas eu tinha trancado minha matricula na faculdade e sentia que precisava voltar pois meu futuro seria muito melhor após um curso superior do que estagnar como um técnico, mesmo trabalhando em uma empresa espetacular. Foi uma grande experiência e não me arrependo da decisão.

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