Estratégia Invertida
Em 1983, houve um evento preparado pela FINEP, que financiava o projeto ATTMM onde eu trabalhava. Esse evento reunia todas as instituições da área de defesa que tinham projetos que estavam sendo financiadas pela FINEP. O objetivo do evento era avaliar o andamento dos projetos. Cada gerente de projeto deveria apresentar seu projeto e o estado em que se encontrava.
Participei do evento com muito
interesse. Durante um intervalo, pude
conversar com um engenheiro que trabalhava no IPqM em um projeto para se propunha produzir
girômetros mecânicos do tipo Dry-Tuned.
Ele me descreveu a real situação do projeto. Haviam construído um prédio, importado
equipamentos caríssimos, mas não havia ninguém para operá-los, pois todos
haviam saído do projeto, devido aos baixos salários. Ele mesmo, já estava demissionário aguardando
o aviso prévio.
Aquilo me deixou muito triste
e perplexo. O que teria acontecido? Na minha inexperiência (afinal eu ainda não tinha 5 anos de formado) eu achava que tudo se resumia aos baixos
salários. Entretanto, o tempo mostrou
que não.
Eu deixei o CTEx, em 1985, ainda
em construção. Tive a oportunidade de
retornar lá em 1989, para assistir um curso dado pela EAI (Eletronic Associates
Inc.) sobre simulação híbrida. Meus
antigos colegas quiseram me mostrar como havia ficado o CTEx e me levaram para
um ligeiro “tour”. Novamente me deparei
com algo surpreendente. Me levaram a um
prédio novo, totalmente equipado com computadores de última geração, entre
outros equipamentos. Com um detalhe –
não havia ninguém dentro. Tiveram que
conseguir uma chave para abrir a porta do prédio, para que eu pudesse visitá-lo.
Pude então perceber que, o que eu havia
ouvido falar em 1983, estava se repetindo diante dos meus olhos.
No início da década de 90 fui
convidado pelo CNPq para fazer parte da análise de uma proposta de projeto como
consultor ad-hoc. O projeto tinha
exatamente o mesmo objetivo daquele de 1983.
Seu cronograma propunha fazer o tal sensor em 3 anos. Sendo que os 2,5 primeiros anos seria para
construir as instalações e comprar os equipamentos (de novo – só que em outro
lugar) e, efetivamente, produzir o sensor em 6 meses. Então perguntei ao
pesquisador que seria o chefe-técnico do projeto: quantos girômetros você já
fez até hoje ? Nenhum, foi a
resposta.
Incrível! Na minha opinião tal desenvolvimento levaria
em torno de 5 anos e ele pretendia fazer em 6 meses sem jamais ter feito algo
semelhante. Ele não tinha a mínima idéia do que estava propondo.
Repetia-se novamente a estratégia
invertida: primeiramente prédios, depois equipamentos e finalmente gente. Será que é tão difícil de perceber que pesquisa
se faz com GENTE ? Gente usa equipamentos. Esses, por sua vez, poderão precisar de algum
prédio especial. Inverter a ordem não
produzirá nada a não ser prédios vazios com equipamentos de centenas de
milhares ou milhões de dólares desperdiçados.
Em se tratando de instituições
públicas, isso pode ser entendido pela legislação. Comprar equipamentos é o mais fácil, basta
ter dinheiro. Construir prédios dá mais
trabalho legal. É preciso mais que projeto
e dinheiro. São necessárias outras
autorizações. Já contratação de pessoal
mais parece ter saído de uma obra de Kafka.
A dinâmica do desenvolvimento
científico no Brasil, tem seguido essa estratégia invertida há décadas. Se quisermos ser um pais realmente relevante,
precisamos usar a estratégia certa.
Falta estratégia, falta politica de estado. As coisas começam e nunca terminam. Me lembra uma frase que li uma vez em uma revista. Não basta apenas ter iniciativa, precisamos ter também a acabativa.
ResponderExcluir