LIMPANDO A ÁREA
A subdivisão de controle era dividida em 4 seções : pilotagem (da qual eu era chefe); guiamento; sistemas inerciais e software. Periodicamente o chefe da subdivisão fazia reuniões com os chefes das seções para planejar e avaliar o andamento das atividades. Eu me sentia incomodado com as atitudes do chefe da seção de sistemas inercias o Tenente Embromélio (nome fictício). Embromélio tinha sido transferido de outro instituto e me parecia que não tinha a mínima vontade de estar ali. Sempre que era sua vez de falar das atividades correntes de sua seção, ele criticava de forma grosseira a própria divisão por, segundo ele, nunca ter dado a ele as especificações do que ele devia fazer. Em outras palavras, ele cobrava para não ser cobrado e nunca apresentava nada.
Eu achava ridículo que um engenheiro formado no ITA tivesse tal
conduta. Mas como ele não era
responsabilidade minha, eu me mantinha calado.
Já na seção de software havia o Cristaldo (nome fictício) um tecnólogo
de informática. Na época, tanto os sistemas embarcados como o que
hoje se chama de TI estavam engatinhando e
pouquíssima gente dominava o assunto.
Cristaldo era bom no que fazia e, por isso, tinha uma empresa individual para
consultoria de software. Acontece que
ele usava as instalações do IAE como escritório de sua empresa. Gastava boa parte do seu tempo atendendo os
clientes por telefone e trabalhando em seus projetos pessoais.
No dia 13 de Agosto de 1987 (segunda-feira) logo no início da manhã o
chefe da subdivisão de controle me chamou e me comunicou que estava saindo para
fazer pós graduação na França e me perguntou se eu aceitaria a chefia da
subdivisão. Eu já tinha quase 9 anos de
experiência profissional e já estava fazendo a tese de doutorado. Assim, me julguei apto ao desafio e aceitei. Em seguida fomos ao chefe da divisão que
chancelou a troca.
Desci as escadas num misto de alegria e preocupação e a primeira pessoa
que encontro foi Embromélio. Ainda com
as emoções afloradas pela notícia da promoção, sem pensar um segundo, me dirigi
a Embromélio e disse: “A partir da
semana que vem estarei assumindo a chefia da subdivisão. Aquela sua conversa, de que não faz as coisas
porque não lhe deram as especificações, acabou.
Eu sei exatamente o que você tem que fazer e vou passar para você e vou
cobrar sua execução.” Curiosamente essa
foi a última vez que o vi. Semanas
depois eu soube que ele havia dado baixa da Força Aérea.
Naquele tempo estávamos em plena campanha de lançamento do SONDA IV
–V03, que levaria um módulo de controle digital para basculamento da carga
útil, como prévia da manobra que seria a injeção em órbita no VLS. Evidentemente, o software era o ponto vital.
Devido ao envolvimento de Cristaldo com sua empresa, o trabalho sob sua
responsabilidade começou a se arrastar colocando em risco a data de
lançamento. Procurei o chefe da divisão
e comuniquei o que estava acontecendo e lhe disse que queria a demissão de
Cristaldo assim que a campanha de lançamento terminasse. A resposta dele me surpreendeu: “Mas nós
nunca fizemos isso antes !!” Repliquei
na hora: “então vamos começar agora, onde que eu assino?”
Essa conversa, que deveria ser reservada, chegou aos ouvidos de
Cristaldo que no mês seguinte pediu demissão e nunca mais tive notícias dele.
Após quase nove anos de ver pessoas terem atitudes que eu considerava
antiéticas e atrapalhar o trabalho coletivo, eu tinha alguma chance para mudar as coisas. Eu não iria permitir que acontecesse debaixo
da minha autoridade. Sim, estava na hora
de limpar a área.
Chega de quererem fazer do serviço público a casa da mãe Joana, que
apesar do nome fofo significa prostíbulo ou puteiro. Eu estava disposto a dar o meu melhor para
ter uma gestão impecável e produtiva. Não
fazia idéia do que viria pela frente.
Prezado Waldemar, já começo a imaginar o que você deve ter passado: fofocas, enrolação, desculpas... Se fosse uma empresa privada, Embromélio e Cristaldo nunca teriam pisado lá. Iriam trabalhar em algum teatro.
ResponderExcluir