SENDO CHEFE
Sempre achei estranho que novatos em qualquer área de trabalho, nem bem começam suas carreiras já queiram ser chefes. Eu costumava dizer que essas pessoas queriam ser caciques sem jamais terem sido índios. Cheguei a ouvir de um colega no CTEx que ele mediria o progresso em sua carreira pelo número de pessoas que ele mandasse – detalhe, ele não era militar e sim engenheiro. Curiosamente ele se aposentou como professor e, ao menos que considerasse os alunos como seus subordinados, ele nunca teve nenhum.
Essas pessoas olham para o brilho e importância que a palavra chefe
parece trazer, sem ter ideia do que realmente significa chefiar um grupo –
especialmente dentro do serviço público. Minha carreira no IAE ia muito tranquila e
motivante até que eu assumi a chefia da subdivisão de controle. Eu tinha bastante expectativa que poderia
realizar um trabalho muito maior com um grupo do que se estivesse sozinho. Gosto de uma máxima do SEBRAE: sozinho vou mais rápido, juntos vamos mais
longe. Ou seja, eu tinha uma visão de
equipe.
Eu tinha visto várias atitudes de meu chefe e de outros que eu
discordava. Pensava eu, se estivesse no
lugar deles agiria diferente. Então,
quando fui promovido a chefe de subdivisão, vi a possibilidade de implementar
tudo o que eu achava certo. Não fazia ideia
das verdadeiras dificuldades que estariam diante de mim. Não apenas com respeito à burocracia (mencionado
no post Lidando com a Burocracia e ainda relatarei dezenas de outros) mas
também à fúria de outros chefes e superiores bem como dos próprios
subordinados.
Eu me propus a tratar a todos com total igualdade tanto com respeito ao
relacionamento como ao de cobrança. O
primeiro dilema surgiu quando comecei cobrar pontualidade no serviço e logo
percebi que isso me desmoralizaria, pois
alguns cumpriam e outros não. O que eu
deveria fazer com os que não cumpriam ?
Puní-los ? Por outro lado se não
fizesse nada, aqueles que se esforçavam para cumprir suas obrigações se
sentiriam injustiçados e desmotivados.
Houve uma engenheira que faltou uma semana ao trabalho e nem justificou
(o que era sua obrigação). Quando
retornou, eu tomei a iniciativa de lhe perguntar o motivo e este não era
absolutamente justificável. Então,
procurei ser condescendente e lhe propus que descontasse das férias. A resposta me deixou indignado: “minhas
férias são sagradas”. Minha resposta foi
mandar descontar a semana faltosa do seu salário (somente possível naquela
época – hoje com o RJU nem pensar). No
mês seguinte, ela me procurou dizendo que havia procurado o departamento
pessoal para abrir um processo contra mim mas que havia desistido. Terminou dizendo: “dessa vez eu vou deixar passar”. Fiquei tão estupefato com a atitude tão
absurda que nem respondi. Hoje eu
responderia sarcasticamente: puxa, muito obrigado, vc é muito legal mesmo,
continue assim que você vai longe.
Tempos depois, uma engenheira (que chamarei de Viscosa) havia sido transferida de
outro instituto para o meu grupo (semelhante ao Embromélio). Ela chegava todos os dias muito
atrasada, tanto pela manhã como após o almoço, mas era muito pontual na
saída. Passada algumas semanas eu a
procurei e tentei ser o mais delicado possível: Viscosa estou percebendo que
você tem um problema com o horário, disse eu.
Sua resposta foi curta e grossa: “ e daí ?” Isso me irritou imediatamente e já mudei o
tom de voz: "e daí que isso está errado".
Ela replicou: "Isso, por acaso, está prejudicando o trabalho ?” Trepliquei:
Deveria, pois se você não está aqui, como poderia trabalhar ?
A partir daí, Viscosa descambou a me dizer desaforos. O mais engraçado foi ela dizer que meu
problema era ser muito milico...
Comecei a anotar tudo que ela estava me dizendo pois já havia decido
tirá-la da equipe e pretendia dar parte dela.
Como sua petulância parecia que não tinha limites ela disse: "você está
anotando isso para distorcer depois".
Repliquei: "é exatamente o
contrário; não quero esquecer nem uma palavra do que está sendo dito agora; é
para evitar qualquer mal-entendido de ambos os lados".
No mesmo dia, procurei o diretor do instituto e solicitei sua
transferência. Passado algum tempo, ela
pediu demissão e foi embora.
Eu não havia estudado muito para me defrontar com problemas como esses. Aspirava ser um grande cientista e descobri que a energia que se gasta para lidar com problemas de relacionamento interpessoal e com burocracia inútil (muitas vezes estúpida) não deixa muita energia para realmente trabalhar naquilo que é o objetivo da função (desenvolvimento técnico avançado). Essa angústia me seguiu até a minha aposentadoria.
Minha curta experiência de vida mostrou que o chefe ideal é o profissional intermediário, pois o competente fará falta em seu posto e o incompetente irá atrapalhar a vida de todos.
ResponderExcluirA função do chefe é oferecer condição de trabalho para todos, isso um intermediário consegue fazer de forma brilhante, o problema é que os intermediários estão ficando cada vez mais raros.
Isso obriga os competentes a assumirem a chefia, criando o caos, com um chefe competente não conseguindo gerar resultados por mandar em incompetentes.