CAPÍTULO ANTERIOR

Naquela época (1992) as cadeiras da engenharia eram anuais e as notas trimestrais.  Após o primeiro trimestre, como já era esperado, o resultado foi bem ruim.  Então, a turma fez uma abaixo-assinado contra mim no departamento, solicitando que o curso fosse reiniciado. 

O chefe do departamento, um professor mais antigo e muito educado, veio conversar comigo pedindo que eu recomeçasse a matéria desde o início e procurasse uma maneira de motivar os alunos.  Eu disse para ele que faria tudo o que ele estava pedindo mas que eu tinha certeza que não adiantaria pois o problema era outro.

Na aula seguinte eu avisei a turma que recomeçaria a matéria e que iria dar um trabalho para melhorar a nota.  O trabalho proposto seria uma monografia sobre um tema à escolha do aluno, entre 8 temas que eu escrevi na lousa.  Não era obrigatório.  Quem não quisesse fazer não haveria nenhum problema e quem fizesse poderia ganhar até 2 pontos para somar na média.  Veja bem – somar na média.  Se o aluno caprichasse e tirasse 2 e tivesse média 3 ele passaria de ano.

Como eu havia mencionado no post anterior, a média de frequência era entre 50 e 60 alunos na sala.  Depois que eu recomecei o curso caiu para menos de 30.  Ou seja, não estavam interessados em aprender, era pura embromação para atrasar a matéria fazendo-se de vítimas.

O mais incrível foi a entrega das monografias.  Menos de 30 em uma turma de 110 alunos.  De um modo geral eram bem fracas mas uma chamou a atenção. 

Estava numa pasta de cartolina contendo um maço de folhas caprichosamente datilografadas (naquela época ainda não havia editor de texto disponível) com figuras fotocopiadas (xerocadas como se dizia) um primor.  Como chamou a atenção foi a primeira que peguei e, para minha surpresa, a primeira linha dizia assim: “Conforme vimos no capítulo anterior ...”  Como assim ? A monografia não tinha nenhum capítulo e começava falando de um capítulo anterior ? 

Folheei rapidamente o texto e reconheci os gráficos.  Era de um dos livros texto indicados no curso.  O aluno copiou integralmente (ou pagou para alguém fazê-lo) um capítulo inteiro do livro texto (da primeira até a última letra) como se aquilo fosse uma monografia do assunto sugerido.  O mais cruel disso é que era o capítulo errado.  O capítulo copiado não falava sobre nenhum dos 8 temas sugeridos.

Tive uma sensação mista de rir da situação ridícula e ficar bravo pois claramente era uma tentativa de me engabelar.  Acho que eles estavam acostumados com professores que pedem os trabalhos e não leem.  Se deram mal pois eu sempre li e corrigi todos.

Para esse trabalho eu imediatamente dei nota zero e escrevi um recado.  “Teria sido mais barato xerocar logo as páginas do livro”.  O autor do trabalho nunca me procurou para dizer nada.

É interessante racionar sobre esse episódio.  Um grupo de alunos pede ajuda e você se esforça para ajudar.  Logo você percebe que se tratava de uma dissimulação.  Não estavam interessados em aprender.  Só queriam passar e a qualquer preço mesmo que fosse as custas do seu caráter. 

Se já estava assim no primeiro trimestre, imagina como seria o fim do ano.

Comentários

  1. Daí já se nota que o desvio de caráter não tem ambiente nem idade...
    Lembro bem das suas orientações, pra nunca copiar trechos do livro, sem a devida nota de citação.
    Atualmente temos aplicativos que rastreiam possíveis plágios e/ou cópias, já que é tudo digital. Naquela época usávamos as bibliotecas físicas, livros físicos, não existia o Google. Só tínhamos o notepad, pra edição de texto, e o acesso a impressora era restrito. Bom... isso não impedia as "malandragens"...

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  2. O problema é encontrar estes ex-alunos já como “profissionais” e muitas vezes em cargos de liderança, no mercado de trabalho ou empresa em que você vai atuar ! Conviver com “ex-alunos” que agiram dessa forma, eé insalubre!!!

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  3. Paul, the Freír não venceu dessa vez. Lágrimas de chumbo incandescente ressoam no Hades

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