CABO DE GUERRA

Na época que eu estava no Rio de Janeiro, trabalhando no projeto ATTMM no Forte São João, surgiu um problema que nos foi relatado pelo gerente do projeto o Tenente-Coronel Severo (já falecido).  Um outro TC chamado Paraguaçu (nome fictício) “inventou” um projeto que queria drenar recursos do nosso.

O projeto proposto era fazer um tipo de calculadora portátil para tiro para de artilharia.  Hoje seria uma espécie de aplicativo de celular que diria o ângulo que o canhão deveria atirar.  Na época eu achava um tanto despropositado o projeto e hoje acho que ele seria mais válido para o exército do que o ATTMM.

O problema, entretanto, não era o objetivo do projeto, mas sim o fato de que ele não tinha nenhum financiamento para sua execução.  O diretor do IPD então deu ordens para que Paraguaçu pegasse recursos do ATTMM.  Severo, evidentemente, tentou mitigar a situação dando o mínimo possível já que não poderia desobedecer a ordens superiores.

Não sei que fim levou esse projeto, mas o episódio me traz questionamentos que são válidos até hoje.  Como poderia haver ingerência sobre a condução de um projeto de pesquisa no que diz respeito aos recursos destinados especificamente para aquele projeto?  Note que não estou me referindo a algum tipo de corrupção pois o recurso era usado em outro projeto.

Naquela época eu era muito novo para entender como as instituições de pesquisa funcionavam.  Não deveriam ter elas verba para desenvolver suas próprias pesquisas ?  Não foi para isso que foram criadas ? 

Foi então que descobri que havia agências financiadoras de pesquisa.  Nelas uma organização poderia propor um projeto e solicitar o recurso necessário para desenvolvê-lo.  Faria todo o sentido que novas idéias e novas tecnologias motivassem a existência desse tipo de projeto.  Mas os projetos ligados diretamente ao objetivo central dos institutos não deveriam ter recursos já alocados ?  Precisaria um projeto avançar nos recurso de outro ?

Mesmo hoje as organizações de pesquisa mal têm verbas para manutenção de sua vida vegetativa.  Não estou me referindo aos salários dos funcionários, pois esses vêm de outra fonte.  Entenda-se por conta de luz, água, limpeza e, principalmente, manutenção de equipamentos.  Não há recursos para executar sua finalidade.  Acabam por depender dos recursos dos projetos financiados.

Então, acontece um verdadeiro cabo de guerra por esses recursos.  Cada um puxando a brasa para sua sardinha, mesmo que os recursos estejam designados para finalidades específicas.  Isso só é conseguido com uma maquiagem para explicar os gastos.

Curioso é que as agências de fomento sabem disso, pois colocam no texto do contrato proibição explícita de uso dos recursos para os gastos da existência básica do instituto.  Não seria muito mais fácil para todos se os institutos de pesquisa já tivessem verba no orçamento não apenas para sua vida vegetativa mas para sua finalidade ? 

Enquanto isso não acontece, o cabo de guerra continua.  Como conseguir produzir pesquisa de forma séria dessa maneira ?

“As realizações dos homens tornam-se mais notáveis quando se leva em conta as limitações sob as quais trabalham” Thornton Wilder 

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