ESPIONAGEM

 Em 1992 recebi a visita do Ronald, representante da Contraves, quem eu já conhecia desde a época do projeto ATTMM no IPD.  Havia sido ele quem havia pago minha visita a Pittsburg em 1983.  Como representante ele visitava periodicamente as instituições que tinham mesas rotativas (era o caso do IAE).  Assim, era pois bastante conhecido de todos.

Nesta visita ele me disse que queria que eu conhecesse um antigo colega de classe dele, que ficou sabendo estava morando no Brasil.  Nos encontramos para um almoço no hotel em frente ao CTA e eu estava esperando alguém com o mesmo aspecto de gringo do Ronald.  Entretanto David era baixo e de cabelo bem preto, falando português sem nenhum sotaque.

David me contou que trabalhava em uma empresa de Resorts e estava procurando um local para construir um no Brasil.  Ele me falou o nome da empresa (que eu nunca ouvira falar) e perguntou se eu não poderia indicar algum lugar nas imediações de São José dos Campos.

Depois disso ele veio com a esposa (brasileira) a São José, algumas vezes, para darmos algumas voltas nos arredores.  Nessas visitas as conversas começaram a me deixar desconfiado de que ele não era quem dizia ser.

Num belo dia ele me liga e disse que estaria deixando o Brasil no dia seguinte e gostaria de me apresentar um amigo.  Marcou comigo, naquela mesma tarde, um encontro num shopping após o expediente.  Ele apareceu com uma mala 007 da Sansonite (muito cara) e me deu de presente como gratidão pelos passeios que eu havia feito com ele.  Então me apresentou o Jack.  Esse não tinha como negar.  Era um gringo explícito.  Alto, ruivo, com a pele muito queimada porque havia acabado de chegar do Iraque.  As coisas estavam ficando cada vez mais esquisitas.  Nunca mais vi David.  Ele desapareceu.

Jack se apresentou como adjunto do consulado americano em São Paulo (deu-me seu telefone e até tinha secretária).  Explicou que estaria no Brasil para facilitar o comércio bilateral.  Depois desse dia, veio me visitar algumas vezes.  Demonstrando bastante empatia, trouxe até a esposa para a festa de aniversário de um dos meus filhos.  Entretanto, nada disso estava me iludindo.  Eu já havia avisado ao serviço de inteligência do CTA do contato suspeito que estava tendo.

Até que finalmente Jack tentou a verdadeira jogada.  Me disse que precisava entender melhor o que fazíamos aqui em São José e que precisa de um consultor para orientá-lo (muito convincente, só que não).  Me ofereceu 800 dólares mensais para ser seu “consultor”.  Como eu já esperava por isso, respondi tranquilamente:  sou professor universitário e tudo que eu ensino posso lhe informar tranquilamente.  Entretanto, as atividades profissionais são sigilosas e essas não posso comentar.  Foi a última vez que vi Jack.

Em 1995, a revista ISTO É publicou uma reportagem intitulada Amigo Secreto, onde aparece a foto de Jack sendo rastreado pela polícia federal e, em seguida, deixado o país.

Quando comentei com meu chefe sobre o ocorrido, ele me contou que também já havia recebido o mesmo tipo de proposta (de outra pessoa) e que também havia sido oferecido 800 dólares.  Levei na brincadeira e disse que havia uma tabela para “consultores”. 

Entretanto, o relato não tem nada de engraçado.  Assim, como eu e meu chefe dissemos não, quantos teriam dito sim ?  Para quem acha que espionagem é coisa de filme de James Bond e que aqui não existe gente querendo informações sobre o que fazemos, está redondamente enganado. 

Minha mãe dizia que quem não deve não tem nada a esconder.  Ela estava errada.  Não se trata de se estar fazendo coisas erradas.  Basta a informação que você vai passar o fim de semana na praia para que o ladrão entre na sua casa e roube tudo que está lá dentro. 

Informação é uma forma de poder !!  Por isso mesmo, deve ser preservada a todo custo pois não se sabe o que se fará com ela.

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