NEM TUDO QUE RELUZ

Em novembro de 1985, poucos meses após minha chegada no IAE, fui para Natal no Rio Grande do Norte onde fica o centro de lançamento da Barreiro no Inferno.  Haveria o lançamento do segundo protótipo do veículo SONDA IV.

No fim de semana, fazendo um passeio pela cidade, fui conhecer o famoso Forte dos Reis Magos.  Linda construção do final do século 16, tinha o formato exato de uma estrela.  Fiquei encantado.

Na minha mente, juntei as seguintes evidências: estou numa cidade chamada Natal, num forte chamado Reis Magos e em formato de uma estrela.  Minha conclusão foi: “que interessante, os portugueses eram realmente religiosos para fazer um forte em homenagem ao Natal”.

Só fui perceber quão idiota tinha sido essa minha conclusão, décadas depois quando estava assistindo a um documentário sobre as guerras do passado.  O formato angular dos muros era uma técnica avançada para ricochetear os tiros de canhão do inimigo.  Nada tinha de comemorativo ou religioso.  A própria cidade só passou a ter o nome de Natal após a conclusão do forte que foi inaugurado em 6 de janeiro, dia dos Reis Magos.

Em outras palavras, minha conclusão estúpida não se baseava em evidências e sim em coincidências.  Me fez lembrar uma frase que ouvia de minha mãe quando era criança – Nem tudo que reluz é ouro. 

Comecei a meditar no assunto e percebi que já havia me enganado outras vezes, de forma similar, quando relacionado às pessoas.  Eu costumava dizer que presenciara uma “anti-metamorfose”.  Metamorfose é o nome dado ao processo de uma lagarta se transformar em borboleta.  Eu havia presenciado, mais de uma vez, uma borboleta se transformar em lagarta.

Pessoas inteligentes e bem formadas, que tinham tudo para serem grandes engenheiros / pesquisadores, passaram a ser improdutivos e inúteis.  Mostravam-se oportunistas e aproveitadores ou mesmo desonestas.  Buscando sempre uma maneira se esquivar do trabalho / responsabilidade e aproveitar ao máximo seus “direitos”.  Eu culpava o serviço público de ser a causa desse processo maligno.

Na verdade, não era bem assim, pois também haviam pessoas que demonstraram grande capacidade de trabalho e resiliência diante de tantas dificuldades financeiras, burocráticas e gerenciais.

Por vezes, me iludi com certas características que me levaram a um julgamento equivocado.  Inteligência nada tem a ver com caráter, nem formação técnica com formação moral.  Conversa mansa e agradável ou mesmo cheia de assertividade podem ser uma forma de marketing pessoal que esconde o que realmente está por trás. 

Sim, nem tudo que reluz é ouro.  É preciso critérios outros, que não o brilho, para avaliar a qualidade do material.  Como disse Einstein: “Nenhum número de experimentos pode provar que estou certo; um único experimento pode provar que estou errado”.  Ao encontrarmos evidências claras de que não estamos lidando com ouro, é preciso agir imediatamente afastando tal personagem.  O problema do serviço público é não se livrar do ouro de tolo, aumentando sua concentração.

Vale uma expressão engraçada que vi em um site “anti-coach”:

“De onde menos se espera aí é que não sai nada mesmo”

Comentários

  1. Sempre aprendo algo com suas palavras, agora entendi a história do tal forte e Natal...rs
    Nem tudo que reluz é ouro... e reafirmo, esses marketeiros de uma só campanha, estão por todos os lados. Caráter é privilégio de poucos, pq "o que interessa é o que importa"...
    Oportunismo, vejo todos os dias...
    Mas cansei de me aborrecer com isso e de sofrer também. Certa ou errada, não sei, mas vou fazendo a minha parte, da melhor forma, e orando pra Deus me blindar.

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  2. Importante é fazermos o certo. Se bem que para muitos o certo é o que traz vantagem, não necessariamente para todos

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