AVENTURAS RUSSAS

A partir de 1992, o IAE iniciou uma forte interação com empresas e instituições Russas, para apoio ao nosso programa espacial.  Esse apoio incluía fornecimento de equipamentos e também orientação técnica.  Para mim, nos 18 anos seguintes, isso gerou 18 viagens para aquele país que, segundo o vice-consul brasileiro, não é outro país e sim outro planeta.

Vivenciei experiências inesquecíveis, tanto agradáveis e enriquecedoras com traumáticas e desgastantes (algumas assustadoras). 

O desgaste físico das viagens (nunca menos que 15 horas de voo), aliado ao fuso horário (variava de 5 a 7 horas – dependendo da cidade e da época do ano) juntamente com o clima (cheguei a ter uma variação de temperatura saindo do Brasil +28° e chegando em Moscou -30°) nada disso diminuía meu ímpeto de estar lá e aprender com quem liderava a corrida espacial.

Certamente aprendi muito com os russos, mas também me envolvi em situações inusitadas e muitas absurdas.  Presenciei in-loco o que o comunismo causa na sociedade e no comportamento do indivíduo.

Só para dar um exemplinho, presenciei um caminhão que vendia lâmpadas (incandescentes) queimadas.  Perguntei para a pessoa que me acompanhava, como alguém compraria lâmpadas queimadas.  Ele me explicou: você compra a lâmpada queimada e leva para seu local de trabalho (que pertence ao estado) troca por uma lâmpada boa e a leva a boa para casa e deixa a queimada no lugar (o estado tem a responsabilidade de trocar).

De modo semelhante, não havia talheres no restaurante da empresa pois já haviam sido furtados e cada funcionário levava seus próprios talheres.  Para você tomar um café, primeiramente comprava a xícara, ante de tomar o café, depois de tomá-lo, recebia o dinheiro da xícara de volta se a devolvesse.  E por aí vai.

O povo russo com quem tive contato tem um temperamento parecido com o nosso.  Gostam de fazer piada de si mesmos.  Não levam as coisas muito a sério e gostam de fazer amizade.  Para se ter uma ideia, havia uma máxima sobre o relacionamento dos trabalhadores russos com o estado e a resposta era:  eles fingem que nos pagam e nós fingimos que trabalhamos.  De um modo geral, um povo bastante sofrido.

Nas minhas viagens consegui um forte contato com o Moscow Aviation Institute e trouxe vários professores de lá para dar mini cursos aqui no ITA e INPE.  Eles disseram que éramos os russos do sul e eles eram os brasileiros do norte.

O contato com a tecnologia espacial russa foi fundamental para o desenvolvimento da minha expertise (aprendi muito mesmo) e do próprio programa espacial brasileiro.  Infelizmente, vejo que não fizemos jus ao que aprendemos.  Além disso, o relacionamento com eles foi se alterando ao longo do tempo, na medida em que deixavam o comunismo e se aproximavam de um novo jeito de ver as coisas.

Vou descrever as experiências vivenciadas através de posts que começarão com AR (aventuras russas)

Comentários

  1. Aguardando cenas dos próximos capítulos.

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  2. Já ouvi o mesmo relato de um amigo. Nas comparações entre brasileiros, indianos, chineses, russos e americanos. A maior diferença entre nós e os russos era a língua.

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