Know-What

Todos conhecem a palavra know-how (literalmente saber como).  Significa o conhecimento necessário para se realizar alguma tarefa em algum ramo de atividades.  Portanto, quando se diz que uma pessoa tem o know-how para certo serviço, isso significa que a pessoa domina aquela área, tem experiência naquilo e, portanto, conseguirá realizar bem o trabalho.

Quando eu ainda trabalhava no IPD/CTEx (na época no Forte São João) ouvi, do então Capitão Pina, uma história interessante.  Ele havia entrevistado o dono de uma empresa que havia se apresentado para executar uma tarefa de interesse no projeto que ele (Pina) gerenciava.  Pina perguntou se eles tinham pessoal capacitado para executar aquela tarefa e a resposta foi: “não temos ninguém mas conheço um cara que está fazendo mestrado na PUC que manja muito do assunto.”  A reação de Pina foi um tanto explosiva.  Chamou a atenção do indivíduo que estava ali tentando enganá-lo.  Disse que estava tomando o seu tempo e o dispensou.

Passados mais de 40 anos do ocorrido, essa história me veio à mente recentemente quando percebi que o fenômeno agora acontece em larga escala.  Vendo chamadas públicas de subvenção (seja FINEP ou de outros órgãos governamentais de financiamento de projetos), empresas se candidatam sem nenhum know-how no assunto em tela.  Esperam que, uma vez contratadas, irão correr atrás de quem faça acontecer, já que não dispõem realmente da competência para fazê-lo.  O que importa é receber o recurso.

Acho que seria uma versão pós-moderna da história do burro falante (vide post).  Prefiro chamar de know-what – saber o quê.  Da mesma forma que aquele empresário foi ao Capitão Pina porque ficou sabendo da necessidade para seu projeto, uma enorme quantidade de empresas faz o mesmo.  Ficam observando as chamadas públicas para saber do que estão querendo fazer e se propõem a fazê-lo, mesmo sem nenhum know-how para isso.

Não estou falando que não existe espaço para o governo financiar uma tecnologia ainda inexistente ou incipiente.  Estou falando de empresas que, para conseguirem os recursos (verdadeiro objetivo) se especializam em preencher os formulários e propostas e estão em todas.  Poderíamos chamá-las de empresas panaceia já que se propõem a dar solução pra qualquer coisa.

Ou seja, empresas com know-what sabem como preparar uma proposta convincente (muitas vezes contando com lobby, evidentemente).  São especializadas em propostas, mas não em realizações.  Escondendo-se atrás do risco inerente às atividades científicas/tecnológicas, acabam entregando gato por lebre.  Isso quando entregam alguma coisa.

Os órgãos financiadores nem sempre são os culpados desse fenômeno.  O emaranhado de leis que garante uma enorme quantidade de direitos, faz parte da expertise das empresas com know-what.  Elas sabem fazer bom uso disso.

Precisamos urgentemente da capacidade know-which para saber a qual empresa confiar os recursos públicos.  Como ninguém é imune de ser enganado e não há sistema infalível, uma possível solução seria criar uma lista de empresas que não entregam o que prometem.  Assim, elas seriam rejeitadas do processo ou nem se candidatariam para dar o golpe.  Mas isso é ilegal.

Enquanto isso, os verdadeiros portadores de know-how são alijados do processo de financiamento governamental. 

“O maior inimigo do conhecimento não é a ignorância, é a ilusão do conhecimento.”  Stephen Hawking

Comentários

  1. Este tipo de empresa muitas vezes consegue sim entregar o prometido as custas de estudantes da pós. Mas o problema é que se apoderam de parte significativa dos recursos, restando para quem, na prática fez o serviço , uma pequena parte do edital.
    Infelizmente é uma das formas mais eficientes das coisas acontecerem no Brasil hoje.

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  2. Olá amigos!

    Pois é, o Dr. Waldemar foi muito preciso no seu relato. Infelizmente isso ocorre e está ocorrendo nesse momento, é uma cultura, e não vejo ninguém com bolas pra lutar contra a essa prática. Consequentemente ela continuará causando estragos ao desenvolvimento científico e tecnológico brasileiro.

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