A.R. NÚMERO ERRADO

 Depois das primeiras viagens onde ficávamos hospedados em apartamentos particulares (vide post A.R. Começa a Saga Almaz) fui me hospedar em um hotel chamado Molodyozhny (juventude).  Esse hotel havia sido construído para os jogos olímpicos de 1980 e me informaram havia sido privatizado.  Na entrada, não notei nenhuma diferença.  A mesma burocracia e confusão. 

O prédio de 20 andares tinha elevadores para números ímpares e para números pares.  Em um certo momento, quando cheguei para tomar o elevador esse acabara de sair e, portanto, iria demorar a voltar.  Tive então a “brilhante” ideia.  Tomar o outro elevador e saltar um andar acima para, em seguida, descer um lance de escadas.  Assim o fiz.

Quando a porta do elevador, no andar acima do meu, se abriu, veio a surpresa.  Postado bem em frente da porta, dei de cara com um sujeito enorme.  Portava uma arma de guerra (provavelmente uma AK47) cruzada em seu peito.  Ele olhou para mim e disse com sotaque russo WRONG NUMBER pondo sua mão em meu peito e me empurrando de volta para dentro do elevador.

Fiquei tão atônico como estático.  Não sabia o que dizer e nada havia a fazer a não ser esperar o elevador voltar ao térreo.  Esperei o elevador correto chegar e fui para meu quarto ainda em estado de espanto.  O que significava aquilo?

No dia seguinte, comentei com um dos meus anfitriões o que havia acontecido e ele disse, com a maior tranquilidade: Ah deve ter sido alugado para a máfia!

Como assim ?  perguntei eu.  Você não havia dito que o hotel estava privatizado ?  Foi comprado pela máfia ?  Não! Respondeu ele.  Ele foi privatizado por andar !?! E, então, concluiu: Russian solutions!  Evidentemente que depois desse episódio, evitei de me hospedar novamente lá.

Hoje penso no absurdo daquela situação.  Não me refiro à forma de “privatização” do prédio.  Mesmo porque acho que meu interlocutor não estava entendendo bem o processo.  Me refiro a tranquilidade com que ele se referiu ao fato de um possível negócio criminoso acontecendo, à vista de todos, sem que houvesse algum tipo de repúdio ou mesmo denúncia.  A aceitação da convivência com o mal como se fosse normal.  A exceção no lugar da regra. 

Seria equivalente a um prédio público no Rio de Janeiro (por exemplo) ser alugado para a milícia e todo mundo soubesse e ninguém achasse qualquer problema nisso.  Seria considerado como se fosse um negócio como outro qualquer.  Não tardaria que todos os negócios honestos fossem contaminados, achacados ou extintos.

Se o mal ou aquilo que é errado não for confrontado, assim como um câncer, crescerá até tomar todo o corpo e matá-lo.

Você pode até pensar: isso não é problema meu.  Ou então ficar preocupado com as possíveis consequências negativas que seu posicionamento contrário pudesse trazer.  Inevitavelmente em algum tempo futuro, as consequências daquele mal chegará até você e aos seus.

O mundo é um lugar perigoso de se viver, não por causa daqueles que fazem o mal, mas sim por causa daqueles que observam e deixam o mal acontecer.  Albert Einstein

Comentários

  1. Aí eu preciso discordar, no Brasil isso acontece assim ou pior.
    Não com um andar, mas com uma "cidade" inteira como nas favelas, onde os traficantes são a lei e os provedores dos necessitados.

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    Respostas
    1. Olá Rafael. Em lugar nenhum eu deixei a entender que isso não acontece por aqui. Chamo a atenção no post para que isso não continue acontecendo pois as consequências virão.

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