TREINAMENTO REALISTA

Em 1980, ainda no projeto Roland, fui designado para ser responsável pela manutenção de um simulador de combate que ficava na EsACosAAe - Escola de Artilharia de Costa e Antiaérea.  O sistema era fantástico, principalmente levando em conta a tecnologia da época.  Não havia nada computacional. Era tudo feito com eletrônica analógica.

O soldado entrava em um ambiente (literalmente uma caixa) que imitava o posto de tiro, onde ele poderia ter uma visão da área externa a ser defendida.  Essa paisagem era escolhida (haviam várias) entre os cenários de guerra na Europa, através de fotos de 360 graus.  Esse “ponto de defesa” seria atacado por diversos tipos de aeronaves com diversas manobras de ataque, que apareciam na imagem do cenário.  Tudo muito real.  O atirador, então, deveria ver o alvo e fazer o disparo do míssil, que aparecia na tela como um ponto de luz.  Como o míssil era tele-guiado, era necessário continuar rastreando o alvo até que fosse atingido.  Se atingisse o alvo, esse desaparecia.  Se o errasse, o avião inimigo continuaria seu ataque em uma manobra específica.

Como a distância de defesa era de apenas 15Km e o voo do míssil em torno de 13 segundos, era acertar ou permitir o ataque.  Que se fosse feito diretamente ao posto de tiro seria a morte do atirador.

Quando fiz o curso de operação desse simulador (comparável aos vídeo-games atuais) o instrutor alemão me contou uma história muito impressionante.  Os soldados da OTAN eram treinados com aquele simulador e era fundamental que soubessem operá-lo com a máxima eficiência pois isso poderia representar o sucesso ou o fracasso da missão de defesa.  Entretanto, como não estavam em guerra de verdade os soldados não levavam o treinamento a sério.

Para motivar os soldados, primeiramente, usaram aquelas técnicas motivacionais que normalmente vemos nos programas de coach: ofereciam caixas de cerveja para quem se saísse melhor; ou folgas nos fins de semana; ou até prêmios em dinheiro.  Nada parecia funcionar.  Os soldados levavam o treinamento na brincadeira.

Até que resolveram fazer um treinamento mais realista.  Amarram eletrodos aos braços dos operadores do simulador e, caso o avião conseguisse fazer a manobra de ataque, uma descarga elétrica era dada no operador mostrando que ele havia sido atingido.  A percentagem de acerto aumentou de menos de 30% para mais de 80%.  Alguns soldados ficavam tão stressados durante o treinamento que urinavam nas calças.  Eles nunca precisaram ser acionados de verdade (isso aconteceu na década de 70) mas certamente estavam prontos caso fosse necessário.

Fico pensando como isso seria visto hoje.  A gritaria que um tipo de atitude dessas geraria. Logo alguém se levantaria para dizer que era um absurdo traumatizante o que faziam com os soldados.  Parece que a realidade objetiva não deve ser enfrentada para que se desenvolva resiliência para com as vicissitudes.  Como deveria ser o treinamento para combate senão da forma mais realista possível?  Vamos viver a vida como se ela fosse um video-game ?  Você dá reset e começa tudo novamente até passar de fase ?

Vivemos numa sociedade com máscaras, melindrada, com gente acostumada a mentiras sobre quem são, seus reais valores e defeitos. 

“Vivemos numa geração de pessoas emocionalmente fracas.  Tudo tem que ser abafado porque é ofensivo, inclusive a verdade”.  Keanu Reeves

Comentários

  1. A degeneração, sob vários aspectos, faz parte de uma iniciativa sutil de conquista de poder. A conquista vai se revelar menos sutil e mais agressiva na mesma medida em que a degeneração ocorrer. No filme "300", foi ilustrado como se identificava um futuro guerreiro. Na vida só se vence pela conquista. Os que não conquistam, sucumbem.

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