FOGO CRUZADO

 Terminei o mestrado (1982) com muito sucesso.  Havia feito 36 créditos e mais a dissertação em 2 anos e meio, mesmo em tempo parcial.  Como no IME não havia doutorado em controle, procurei outra instituição que tivesse.  No segundo semestre de 1983 comecei a cursar os créditos para o doutoramento.  

Eu já tinha definido o assunto que eu gostaria de desenvolver na tese e soube que havia um professor lá que era especialista no assunto - o professor Cho (nome fictício).  Uma das 5 matérias que cursei para cumprir os créditos era a de Cho e, como professor, não me impressionou muito.  Mas era o assunto que eu queria e o procurei para que fosse meu orientador.  Ele aceitou e combinamos de começar a orientação logo após o exame de qualificação.

Segundo as regras da instituição eu deveria prestar 3 provas de matérias que dependiam da área de escolha do tema de tese.  Para cada uma das provas, a nota era aprovado ou reprovado.

A primeira prova foi bastante tranquila e, certamente, a gabaritei.  Na segunda, aconteceu algo curioso.  Eu estava fazendo a prova sozinho.  Depois de pouco mais de uma hora, o professor, que estava dando a prova apareceu, pegou a prova olhou e disse: “pode parar pois já vi que você sabe.”  Foi embora levando a prova e fui aprovado.  

A terceira prova era de uma matéria que eu nunca havia estudado antes.  Me preparei para ela lendo a apostila do professor da mesma.  No dia da prova havia mais 2 alunos.  Ambos já haviam cursado a matéria.  Alguns dias depois, fiquei sabendo, através de Cho que o professor da matéria, que vou chamar de Queiroga, havia solicitado que eu fizesse uma complementação oral (prevista em regimento).  

Cho estava bastante zangado com o fato de que Queiroga o havia repreendido por um orientado seu não ter se saído bem na prova.  Achei aquilo muito estranho pois, na verdade, Cho nem havia começado a me orientar em nada.  Porque ele deveria ser responsável por mim?  Além do mais, eu havia ficado sabendo que os outros 2 alunos, que haviam feito a matéria com Queiroga, tinham sido reprovados.  Ora, para mim,  isso era algo que muito positivo.  Mesmo não conhecendo o assunto, nem tendo feito a matéria, não tinha sido reprovado.

Fiz a prova oral com o próprio Queiroga que me fez perguntas às quais respondi com tranquilidade e fui aprovado.  O estranho é que as perguntas não eram diretamente relacionadas à prova.  Durante a sabatina, Queiroga disse que queria saber se eu dominava alguns conceitos básicos.  Isso me deixou muito desconfiado.  Nada daquilo fazia sentido.

Não precisei de muito esforço para descobrir o que estava acontecendo.  Queiroga e Cho eram inimigos (nunca fiquei sabendo o porquê).  Quando fui comunicar a Cho que havia sido aprovado ele tentou me culpar por ter sido humilhado por Queiroga.  Aí tive que engrossar o caldo e disse:  “eu sei muito bem que vocês 2 são inimigos e eu não tenho nada a ver como isso.  Não me usem para um atacar o outro”.  Diante de minha assertiva, Cho permaneceu calado.

Eu havia caído em um fogo cruzado entre 2 indivíduos com alto nível de conhecimento mas de ética profissional questionável.  Algum tempo depois, fiquei sabendo que Cho havia denunciado Queiroga por plágio em um artigo científico e solicitando sua expulsão da instituição.  Isso era um forte indício de algo que, posteriormente, me trouxe enorme estresse.  Será assunto do próximo post.

Esse episódio foi mais um ensinamento que levei para o resto da vida.  Passei a ser mais criterioso com determinados comportamentos.  Pessoas que não se importam em usar os outros para seus objetivos pessoais.  Esse tipo de gente, mesmo tendo algo a oferecer, também têm algo a tirar.  Principalmente, se você não dança conforme a música que eles queiram tocar.  Devem ser mantidos longe, ou simplesmente cancelados.  

Chamamos de ética o conjunto de coisas que as pessoas fazem quando todos estão olhando.  O conjunto de coisas que as pessoas fazem quando ninguém está olhando chamamos de caráter.”   Oscar Wilde

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