PRÉ DEFESA

 Ao começar formalmente a minha orientação, Cho colocou como exigência que eu deveria publicar 2 artigos em congressos com o assunto da minha tese e assim comecei a desenvolver a mesma.

Em 1986, publiquei um artigo em um workshop do IFAC (International Federation on Automatic Control) em Lund na Suécia.  Em 1987, publiquei outro trabalho em um Colóquio no México e em 1988 publiquei mais um artigo no Congresso Brasileiro de Automática.  Nesse momento, Cho me disse que já bastava e que eu deveria concluir a tese.

A orientação era difícil pois eu já estava morando em São José dos Campos e não havia internet naquela época.  Então, mais ou menos mensalmente eu mandava para Cho, pelo correio, o material escrito que eu havia desenvolvido para discutirmos.  Depois de uma semana eu ia ao Rio de Janeiro, normalmente na própria casa de Cho para nossa entrevista de orientação.

Capítulo após capítulo, fui mandando para Cho e discutindo seu conteúdo.  Até que finalmente concluí o trabalho.  Então preparei uma versão completa da tese e encaminhei para Cho.  É importante ressaltar que a impressão era feita em impressora matricial e dava muito trabalho e gasto fazê-lo.

Eu estava aguardando a revisão do texto quando veio a bomba.  Quando fui ao Rio me encontrar com Cho na universidade, ele me disse que chegara a conclusão que, embora meu trabalho estivesse bom, ele não julgava que merecia o título de doutorado!!

Aquilo me pegou completamente de surpresa.  Argumentei, imediatamente, que eu havia submetido cada passo do trabalho para ele.  Em momento algum ele havia questionado a qualidade ou nível do assunto.  Só após a conclusão do mesmo é que ele concluíra que não era suficiente ?  Foi quando ele disse que iria fazer mais uma exigência - eu deveria publicar um artigo em revista (journal) com o tema da tese.

Atualmente isso é uma exigência corriqueira em cursos de pós-graduação.  Naquela época (30 anos atrás) não.  O processo de revisão era lentíssimo (via correio) e a quantidade de submissões muito grande para um pequeno número de revistas.  Levava-se mais de um ano para se conseguir uma publicação.

Eu já havia atendido às exigências iniciais e ele mesmo havia dito ser suficiente.  Foi quando fiz a colocação: “mas isso não é uma exigência do departamento”.  Cho respondeu: “em breve serei o novo chefe do departamento e então passará a ser obrigatório”.  Repliquei: “ok para o futuro e não para o passado, não é válido mudar as regras do jogo no final do jogo.”  A conversa terminou sem nenhuma conclusão.

Saí de lá desnorteado e tentei fazer uma avaliação imparcial.  Será que aquele trabalho de tantos anos não valeria um doutoramento ?  como obter a resposta ?  Fiz 4 cópias da tese e enviei para 4 doutores de instituições diferentes, solicitando que me dessem sua opinião à respeito da qualidade do trabalho.  3 responderam positivamente e 1 não respondeu por ser amigo de Cho e não querer desagradar o colega.

Cho passou a se fazer de morto deixando o tempo passar.  Enquanto isso fui procurando melhorar o trabalho e tentando conseguir uma publicação em revista.  Acontece que o prazo para concluir o doutoramento estava se aproximando e era preciso definir uma data de defesa da tese.  Então Cho tomou a seguinte atitude.  Definimos, em conjunto, 4 doutores que seriam a banca de tese (5 com o próprio Cho).  Ele enviou a cópia da tese para os 4 doutores com uma carta solicitando uma avaliação prévia do trabalho.  Nunca vi o conteúdo dessa carta.

Cho, então, me disse que só marcaria a data da defesa se houvesse unanimidade nas respostas dos 4 doutores que aquele trabalho era digno de uma tese de doutorado.  Para surpresa dele, os 4 foram unânimes, e Cho foi obrigado a marcar a data da defesa.

Ele havia inventado uma pré-defesa.  Aquelas alturas eu já havia percebido o quão autoritário (e injusto) ele era e que o episódio do exame de qualificação (vide post Fogo Cruzado) já era um indício do que ele era capaz.  Entretanto, graças às regras bem feitas daquela pós-graduação, ele se viu obrigado a cumprí-las.

Eu estava absolutamente seguro de meu trabalho, mas não era o conteúdo que estava em questão e sim o ego de alguém que não aceitava ser contraditado.

Comentários

  1. Pois é, Professor, o senhor acompanhou minha saga com orientador no mestrado, mas diferente do senhor eu não estava nada confiante. Só me convenci que meu trabalho era digno do título de mestre quando vi a assinatura do senhor na ata...

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  2. Caramba, quanta mesquinhez daquele "doutor". Poder e ego juntos, como diria O. Niemeyer, é uma m...

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  3. Acho que vale a pena fazer uma pesquisa histórica, saber se esse o orientador deste professor foi tão exigente assim. Acredito que não vai encontrar tanta rigorosidade no passado desta pessoa.

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