O INCENTIVO

 Como já venho contando, a década de 90, devido aos salários muito baixos, foi muito difícil para aqueles que queriam continuar trabalhando no IAE.  Digo aqueles que queriam porque muitos não quiseram e saíram do instituto.  

Num certo momento recebi uma circular (um papel impresso com orientações institucionais) emitida pelo vice-diretor o Coronel Cretácio (nome fictício).  Esse documento dizia, de forma resumida, o seguinte:  Incentivamos os pesquisadores que puderem buscar financiamento das agências de fomento, que o façam!

Não havia nenhuma surpresa nisso.  Eu mesmo já havia solicitado financiamentos FAPESP e CNPq (vide post Notebook) e continuei solicitando independente daquele incentivo.  Entretanto, achei um tanto estranho a tal circular.

É importante que se esclareça que nenhum financiamento poderia ser solicitado sem a chancela da instituição. Ou seja, o documento que solicitava o auxílio (seja ele o que fosse) teria que ter a assinatura do responsável institucional.  Em outras palavras, o IAE já sabia de todas as solicitações feitas em andamento e qual o valor de cada uma delas (estava explícito na documentação).

Vale também dizer que nem todo tipo de financiamento envolve algum tipo de pagamento para o proponente.  De um modo geral, o proponente não ganha nada, somente recebe recursos para pagamento de despesas relacionadas ao projeto proposto.  Há, porém, grandes projetos (chamados integrados) ou bolsas de pesquisador credenciado.  Para esses, o proponente recebe uma bolsa cujo valor depende do nível do pesquisador.

Pouco mais de um ano da tal circular incentivadora, saiu uma outra circular onde Cretácio solicitava que todos aqueles que tinham algum tipo de auxílio pessoal, deveriam informá-lo imediatamente.   

Naquela época eu ainda não tinha o credenciamento de pesquisador do CNPq (por 12 anos fui pesquisador 1B), então nada tinha a informar.  Entretanto, a solicitação era um total absurdo.  Isso sim era um grande desincentivo.

Primeiramente, porque mostrava um total descontrole do acompanhamento dos financiamentos solicitados para o instituto (se é que havia algum).  Lembrando que todos passavam por ele para assinatura.  Além do mais, todos os valores dos projetos estavam explícitos nas propostas.  Portanto, ele teria como saber o que estava querendo sem perguntar pra ninguém.  

Sua preocupação deveria ser orientar as propostas de financiamentos para que apontassem para os objetivos institucionais.  Não se tratava apenas de trazer recursos para a instituição.  Deixando que as propostas tivessem origem apenas nos interesses pessoais dos proponentes, os recursos seriam pulverizados - principalmente os recursos humanos.  Que passaram a se dedicar aos pequenos projetos e até se recusavam a prestar serviço para os atividades institucionais.  

Porque ele estaria tão interessado em saber o que alguém estaria ganhando individualmente ?  Estaria desconfiado de algum tipo de trambique ?  Estaria preocupado com alguém ganhar muito dinheiro com os projetos (as bolsas sempre foram tabeladas) ? Será que achava que poderia haver algum enriquecimento ilícito ?

Ao não cumprir sua verdadeira missão e passar a se preocupar com alguma possível desonestidade.  A atitude de Cretácio se soma à burocracia estatal, que parte do pressuposto de que todos são potencialmente desonestos para criar uma miríade de regras, para impedir o ilícito.  Não impede - haja visto as malas e cuecas cheias de dinheiro e as centenas de milhares de auxílios indevidos.  Mas impede as pessoas sérias de trabalhar.

Precisamos de gestores que foquem no objetivo institucional e não nos meios (burocracia) para alcançá-los.  

“ Burocracia: uma dificuldade para cada solução. 

Comentários

  1. Certa vez, conversando com ex-colega do INPE que tinha acabado de voltar do DLR (isso foi bem na época da copa no Brasil). Das conversas, duas chamaram atenção, a diferença de como comprar alguns componentes e mandar fabricar uma PCB, que resumidamente, não geram entraves para pessoas honestas. A segunda, após ele ter avisado para tomar cuidado com os buracos nas estradas, os alemães questionaram a FUNÇÃO dos buracos. É claro que eram todos jovens, devem ter ouvido falar apenas do Rio e da Amazônia.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

HOMEM DE CONFIANÇA

SABOTADOR

BARATO QUE SAI CARO