A. R. – no covil da Máfia

Em 1999, Lapin, o então diretor da empresa que nos havia vendido as plataformas inerciais para o VLS, propôs transferência de tecnologia para esse tipo de equipamento.  Segundo ele, não exatamente o equipamento que nos fora fornecido pois era de uma tecnologia antiga.  Seria algo mais moderno para o qual não tínhamos conhecimento.

Na minha estada em Moscou, Lapin propôs que eu me encontrasse com a pessoa que seria o principal líder no fornecimento da tal tecnologia.  Eu aceitei, animado com a possibilidade de acesso a alguma tecnologia de ponta ou mesmo secreta.

Após o almoço, Lapin me pegou em seu carro particular e fomos para um endereço desconhecido.  Até aí, nenhuma novidade.  Era comum não comentarem nada do que estavam fazendo ou mesmo do que seria feito.  Tudo sempre foi muito misterioso no relacionamento com aquela empresa.  Naquele dia passou dos limites.

Chegamos em frente de um prédio estranho.  Ao mesmo tempo que tinha o aspecto de um centro de atrações, era todo fechado sem janelas térreas.  Uma porta larga, porém com um controle diferente do que eu estava acostumado nos padrões russos.

Comecei a ficar desconfiado quando percebi que havia um rapaz sentado sob uma mesa, bem defronte daquela porta.  Ele portava abertamente um revolver na cintura.  Na minha mente, fiquei pensando qual seria o motivo daquela postura e, principalmente, de estar armado.

Após a entrada havia um corredor largo que nos levou a um grande espaço que lembrava um tipo de ginásio de esportes.  Havia uma arena oval menor que uma quadra de basquete, cercada por uma arquibancada.  Imaginei que poderia ser uma pista de dança.  Se fosse, qual seria a razão da arquibancada?  Hoje penso que poderia ser local para algum tipo de luta.  Fosse o que fosse, não se assemelhava a nenhum centro de pesquisas onde poderia haver algum tipo de tecnologia avançada.

Atravessamos aquela quadra para o outro lado onde havia um corredor com diversas salas.  Percebi que parecia com aqueles prostíbulos que vejo nos filmes.  Então, tive a certeza de que estava em um covil da máfia.  Porque Lapin tinha me levado ali?  Estaria eu correndo algum risco?

Chegamos a uma pequena sala de reunião onde havia um senhor bem idoso sentado.  Era ele que tínhamos ido encontrar.  Entretanto, o aspecto do velho não era nada saudável.  Ele estava pálido, talvez doente ou morto de medo.  Havia um outro homem junto que não sei quem era nem o que fazia ali.  Como o tal cientista só falava russo, toda a conversa foi intermediada por Lapin, que falava muito pouco inglês.  Não consegui entender praticamente nada do que foi discutido.

Eu não via a hora de sumir dali e fiquei muito feliz que, ao que parece, eles não se entenderam e a conversa acabou rápido.  Do mesmo modo que chegamos, saímos.  Lapin estava contrariado.  Evidentemente, não me disse o porquê.  A história da transferência de tecnologia morreu ali.

Quando lembro desse episódio, me pergunto se o tal cientista (que nem ao menos soube do nome) não seria algum tipo de refém.  Pode até ser um tanto hollywoodiano, mas parecia que tiraram ele de alguma masmorra, onde era obrigado a trabalhar para a máfia, para participar daquela reunião.  Também não tenho a mínima idéia do que deu errado no acordo que Lapin queria fazer.

A partir desse episódio passei a me preocupar seriamente com o que eu fazia ali.  Estava sempre ligado nos assuntos técnicos e queria aproveitar ao máximo as oportunidades de aprender.  Então, percebi as forças ocultas que controlavam o conhecimento deles.  Não deveria me preocupar com os agentes de inteligência de outros países e sim com quem eu estava me relacionando.  Quando, alguns anos depois Lapin morreu de forma misteriosa em sua própria sala de trabalho, me lembrei desse momento e com quem ele se relacionava.  

Isso me fez lembrar uma frase do poeta Fernando Matos

A cada esquina um perigo a nos espreitar, em toda a caminhada a Proteção Divina para nos livrar.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

HOMEM DE CONFIANÇA

SABOTADOR

BARATO QUE SAI CARO