SUCATA
Quando a reforma do prédio das salas começou, a primeira providência foi retirar todo o material que não seria mais utilizado ou que seria recolocado posteriormente. Isso incluía uma grande quantidade de cabos de rede (aqueles cabos azuis que ainda são utilizados atualmente). Essa cablagem estava distribuída ao longo do prédio, em diversos pontos, em todas as salas. A quantidade total retirada chegava facilmente a centenas de metros de cabos.
Esses cabos foram amontoados
em uma sala antes de serem removidos. O
volume total deveria dar mais de 2 metros cúbicos de um emaranhado de cabos
azuis. Antes das obras começarem, esses
cabos foram encaminhados para o setor de informática do instituto.
Já naquela época,
desconfiado com o desaparecimento das minhas placas de alumínio (vide post as
plaquinhas), passei a andar com uma câmera digital nas mãos (não havia smart
phone na época). Passou a ser minha
companheira obrigatória em todo lugar que eu ia. Quando vi aquela pilha de cabos num grande
amontoado aquilo me chamou a atenção.
Como se algo sobrenatural estivesse me dizendo: tire uma foto
disso. Foi o que eu fiz.
Quando a reforma do
prédio estava quase concluída, solicitei ao setor de informática que me
devolvesse os cabos para que fossem reinstalados. Qual não foi minha surpresa quando o
responsável apareceu na minha sala com um rolinho de cabos nos braços, que não
chegavam a 10 metros. Então perguntei:
cadê o resto ? Recebi como resposta:
isso foi tudo que recebemos !!!
Lá fui eu novamente dar
parte de furto de material.
Diferentemente do caso das plaquinhas, que foi um trâmite apenas de
papelada, dessa vez fui procurado por um oficial (não lembro o nome nem a
patente) encarregado da investigação. Ele
foi direto ao ponto. Se identificou e
perguntou se eu tinha alguma prova do que estava denunciando. Eu lhe mostrei a foto. Seu rosto se iluminou com um sorriso semelhante
ao da Vandinha da Família Adams quando disse: Ahhh assim é outra coisa.
Pegou a foto e nunca
mais o vi nem tive qualquer reposta formal da minha denúncia. Obviamente, também não recebi de volta a
cablagem desaparecida. Entretanto, algo
concreto aconteceu. Passado algum tempo,
fiquei sabendo que um esquema de desvio de material do instituto havia sido
desbaratado. O esquema era feito tirando
o material roubado dentro de caminhões de lixo de obra como se fosse sucata.
Isso poderia ser uma história
feliz se não fosse por um detalhe.
Ninguém foi efetivamente punido.
Nesse caso, punição seria processo criminal a todos os envolvidos e,
para os funcionários públicos envolvidos, expulsão. O que aconteceu (como das outras vezes) é que
o processo de roubo foi interrompido e novas medidas administrativas foram
tomadas para evitar que o problema se repetisse. Como não sei quem eram os evolvidos, não sei
o que aconteceu com eles.
De minha parte, fui
ficando cada vez mais preocupado, conforme fui percebendo o tamanho e extensão
das falcatruas que estavam ao meu redor.
Até onde isso iria ? O quê mais eu
encontraria pela frente? A partir daí,
passei a tomar algumas medidas de precaução.
Uma delas foi grampear meu próprio telefone (mostrou-se útil como verão mais adiante).
Nos 36 anos em que
trabalhei no serviço público, nunca vi alguém ser efetivamente punido pelas
transgressões que fizeram. Mesmo aqueles
que eu mesmo solicitei punição, tal não foi realizada. Via de regra, os infratores são transferidos
(vide post Jezabel) e só. Além disso,
novas normas e regras administrativas são geradas na tentativa de impedir que o
mal se repita. Isso sempre me deixou
indignado, não apenas por significar uma tremenda injustiça mas também por trazer
mais burocracia, atrapalhando quem quer trabalhar sério.
Creio hoje que a causa
mais profunda está arraigada a uma cultura do “coitadinho”. Ninguém quer punir ninguém mesmo que seja merecido. Quantas vez ouvi a expressão: Ah vamos dar
mais uma chance... Enquanto isso vamos
todos virando sucata.
O
maior erro de um gestor é tratar o bom funcionário e o ruim da mesma forma. O
bom desanima e o ruim não melhora. "Trate
o diferente de forma diferente" Ducatti (fonte: .'.)
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