PRAXE
Durante o período (2002/2003) que tentei produzir uma plataforma inercial através do projeto SISNAV (vide postagem Gerenciamento Incoerente) aconteceu um outro episódio que vale a pena mencionar.
O recurso financeiro do
projeto deveria ser gasto através da estrutura administrativa do instituto. Assim, em um certo momento, solicitei a
compra de 6 brocas de aço. O custo
aproximado de cada uma seria 1 dólar. Ou
seja, estou falando de uma despesa total de 6 dólares, na rubrica de material
de consumo. Um detalhe importante é que não se tratava de material
importado. Pelo contrário, era um item
tão comum que poderia ser adquirido em qualquer loja de ferragens perto da sua
casa.
Aproximadamente uma
semana depois do pedido, recebi em minha sala, através dos meios formais de
trâmite de informações, uma pasta de cartolina.
Ela trazia uma etiqueta, impressa por computador, com meu nome e os
dados do projeto além da descrição do pedido.
Dentro da pasta havia alguns papéis, escritos à mão, com as anotações
das conversas telefônicas e cotações de 3 tomadas de preço para a compra daquele
item. Finalmente, havia um documento
solicitando a minha decisão para a tão preciosa compra.
Ao olhar um trabalho tão
esmerado como desnecessário, liguei para a pessoa que havia me enviado a tal
pastinha. Fui muito educado com ela,
elogiando seu trabalho e dizendo que ela poderia comprar de qualquer daqueles
lugares, pois a diferença era desprezível.
Aproveitei a oportunidade para dizer que todo aquele trabalho era
desnecessário e teria custado muitíssimo mais do que o preço da aquisição e,
principalmente, da economia que pudesse ter produzido. Sua resposta foi icônica: é praxe do instituto! Além disso pediu que eu respondesse, por
escrito devolvendo a pasta.
Fazendo umas contas
rápidas. Só a quantidade de papel e tinta
gastos naquele processo, seria mais caro que as 6 broquinhas. Somados ao custo do trabalho despendido pela
funcionária que preparou o processo mais a estrutura de distribuição do mesmo,
cheguei à conclusão que o custo administrativo da praxe foi, no mínimo, 20
vezes maior do que a compra.
O que poderia estar
errado nisso? A funcionária não se
sentiu nem um pouco constrangida de gastar seu tempo e recursos materiais para
executar tal serviço. Até achou estranho
que eu tenha reclamado. O que há de
errado é utilizar o mesmo procedimento para comprar uma agulha ou a ogiva de um
foguete.
Até aquela época, havia
legislação que permitia você definir a complexidade do acompanhamento
administrativo em função do custo do serviço final. O problema é que parecia mais fácil padronizar
em um único procedimento para não ter que se decidir a cada caso. Havia, anteriormente, a figura do suprimento
de fundos, que objetivava exatamente esse tipo de despesa. Apresentava-se a nota fiscal e recebia-se o
recurso. Por algum tempo, isso funcionou
muito bem. Até que começaram a criar uma
série de exigências para o uso do suprimento de fundo. Isso gerava um desgaste tão grande que os
interessados começaram a desistir de utilizar.
Tudo isso só me fazia
ter a certeza de que a administração tinha uma vida própria. Ela não existia para operacionalizar os
objetivos institucionais. Na verdade,
parecia que não se importava com os objetivos e sim vivia para resolver seus
próprios embaraços que eles mesmos criavam. Posteriormente, ouvi uma definição
de burocracia que se encaixava exatamente no que eu estava vivenciando: “quando os processos são mais importantes que
os objetivos”.
Assim, passei a utilizar
uma frase que se tornou um mote: “a
operação foi um sucesso, pena que o paciente morreu!!”. Ora essa, se o objetivo de uma operação é
salvar o paciente e ele morreu, a operação foi um fracasso. Porém se a processo operatório é um fim em si
mesmo, aí sim a operação foi um sucesso pois todos os procedimentos foram
seguidos à risca. Mesmo que não tenha
dado em nada pois o paciente morreu (isso seria apenas um detalhe).
Nunca me rendi a isso,
nem me renderei. Focarei sempre nos
objetivos. Devemos combater a burocracia
por ser um grande inimigo (talvez o maior) de qualquer atividade produtiva.
“Burocracia:
A Arte de converter o fácil para o difícil através do inútil.”
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