TESTE PERFUNCTÓRIO
Por volta de 2011, um colega de trabalho (muito competente) planejou um experimento de laboratório para validar seus estudos de doutoramento. Tratava-se de estimular, um tipo de acionador eletro-hidráulico de uma junta flexível, com diversos tipos de frequência simultaneamente para avaliar seu comportamento. Uma vez feito o ensaio notou-se alguns comportamentos não explicáveis pelo modelamento matemático utilizado.
Lembrou-se então de que
haveria, muito em breve, o que chamávamos de ensaio a quente. Tratava-se de fazer um teste muito similar ao
do laboratório com o motor foguete queimando de verdade. Assim, incluímos nesse teste o mesmo tipo de
estímulo que havíamos feito em laboratório para observar se o tal comportamento
se mostraria.
Uma vez realizado o teste,
tivemos acesso às medidas que foram feitas durante a execução do mesmo. Mas faltava uma coisa. Durante o ensaio a quente havia sido feita uma
filmagem com uma câmera especial de alta velocidade. Solicitamos, então, o acesso a essa filmagem
julgando que ela deveria mostrar o tal comportamento anômalo que havíamos detectado
em laboratório ou alguma informação útil para entendê-lo.
A surpresa veio com a
negativa de fornecimento das imagens.
Havia sido, de fato, feito a filmagem mas o filme não havia sido
revelado por ser muito cara a revelação !
Evidentemente, perguntamos então para quê havia sido feita a filmagem já
que ela não seria analisada. Mais uma
resposta estranha. O filme seria revelado
se houvesse um motivo ocorrido, durante o ensaio, que o justificasse e se
houvesse verba, evidentemente.
A situação toda
tornou-se uma conversa doida. Nós tínhamos
razões técnicas para solicitar a revelação do filme. Mas eram baseadas em estudos de laboratório e
não em um evento ocorrido durante o ensaio a quente. Por outro lado, havia um dilema: como se
saberia se havia ocorrido algum fenômeno rápido (motivo da filmagem em alta
velocidade) sem ver o filme que o mostraria ?
Aparentemente os
responsáveis pelo teste e pela filmagem não estavam preocupados com isso. O teste havia sido realizado e era isso o que
interessava, não sua análise em profundidade.
Era mais fácil não revelar o filme e pronto. Considerando que o filme, sendo uma película
química, tinha prazo de validade, dentro de algum tempo a filmagem se tornaria
inútil.
Isso me lembra uma
piada a respeito de alguém que o médico solicitou uma batelada de exames e após
terem sido feitos não foi buscar o resultado.
Quando questionado, responde: fiz o que o médico mandou (os exames) mas
não me interessam os resultados. Vai que
descubro que estou doente...
Qualquer teste se justifica
por sua análise para verificar se tudo ocorreu como previsto e se havia algo a
mais (não previsto). Se não estamos
interessados em explorar todas as informações disponíveis então é de se
perguntar se esse teste não é meramente perfunctório (superficial,
só para dizer que foi feito). Tornou-se
um fim em si mesmo.
Se acha que a
competência custa caro, experimente a incompetência. Miguel Monteiro
"rir para não chorar".
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