A CARONA
Entre 1994 e 2001eu estive dando aulas, à noite, na Universidade Braz Cubas UBC estabelecida em Mogi das Cruzes (65 Km de São José dos Campos). As aulas começavam às 19:00 e havia um ônibus que levava os professores de São José (eram muitos) para lá, que partia em torno das 18:00.
O ponto de partida desse ônibus
era bem próximo da saída do CTA. Dava pra
ir a pé. Entretanto, entre a saída do
CTA e o meu local de trabalho, a distância era de quase 3Km. Então, ao final do meu expediente às 17:15,
eu deixava meu carro estacionado na entrada do CTA (pelo lado de dentro) e
caminhava até o ponto de ônibus.
Em um determinado dia, eu
havia deixado meu carro no conserto e precisaria de carona para chegar até aquele
local de partida. Afinal eu não dispunha
de tanto tempo assim. Era 45 minutos
entre o fim do meu expediente e a partida do ônibus. Talvez desse tempo de chegar a pé mas eu não
queria correr o risco.
Durante aquele dia procurei
alguém que pudesse me dar aquela carona e encontrei o Xilderico (nome fictício). Ele era um bolsista que trabalhava no meu
prédio no andar acima. Ele fazia pós-graduação
em alguma área ligada a aerodinâmica. Eu
só o conhecia de vista e, por coincidência, naquele dia, nos encontramos na
copa tomando um cafezinho.
Xilderico foi muito solícito
em me oferecer carona. Mas havia um
pequeno porém. Ele só poderia sair um
pouco mais tarde. Mais tarde quanto ? perguntei. Por volta de 17:45 respondeu ele. Se você puder me deixar diretamente no ponto
de ônibus é tempo suficiente. Tudo bem
? Claro. Respondeu ele.
Quando chegou 17:45 eu estava
no estacionamento do instituto aguardando por ele. Um tanto preocupado com a hora mas, até aquele
momento, não havia razão para isso. Logo
ele apareceu, andando naquele passo de quem não quer chegar a lugar
algum. Muito calmamente, entramos no
carro e, finalmente, partimos. Quando
estávamos na metade do caminho, eu comentei que havia esquecido algo em minha
sala. Ele imediatamente retornou com o
carro. Eu me assustei com aquilo e disse
que não era necessário. Ele me disse que
fazia questão.
Após vê-lo dirigindo e pela conversa, percebi
que Xilderico não era uma pessoa normal.
Atualmente se diria que ele teria algum transtorno do espectro autista
(está na moda). Quase que tive que dar uma
ordem a ele que não voltasse ao instituto pois isso me faria perder meu
ônibus. Ele pareceu contrariado e,
novamente, deu meia volta e fomos em rumo à portaria do CTA.
Quando saímos do CTA, havia um
engarrafamento enorme no local. Mesmo
para aquele horário, não era normal tal congestionamento. Eu percebi que não chegaria a tempo no ponto
de ônibus (que ficava na avenida paralela aonde estávamos e sem engarrafamento). Pedi então a Xilderico que encostasse o carro
para que eu saltasse, pois poderia ir a pé até o meu destino. Ele se recusou dizendo que havia se
comprometido a me levar até o ponto de ônibus e fazia questão de o cumprir.
Eu já estava muito agoniado
com a situação e a possibilidade de perder a condução até a universidade. Obviamente, percebi que não haveria tempo de
chegar até lá, se continuasse dentro do carro.
Também já havia percebido que não poderia perder tempo em algum tipo de
argumentação com ele. No momento em que
ele deu meia parada no carro, no meio do congestionamento, eu agradeci rapidamente para não
dar tempo de nenhum tipo de reação e saltei do carro no meio da rua. Consegui chegar a tempo de pegar meu ônibus.
Aquele episódio me deixou
muito estressado e alerta para algumas verdades da vida. Foi mais um que se somou à postagem Anexo do
Hospício. Objetivos não são alcançados
apenas com boas intenções e cortesia. É
preciso uma avaliação criteriosa e sábia sobre as condições da ajuda que lhe é
oferecida. Muitas vezes devemos recusar ajuda
de quem não reúne, de fato, condições de ajudar. Apenas tem boas intenções.
"O caminho para o inferno
está cheio de boas intenções" Bernardo de Clairvaux (1091-1153)
Excelente caso.
ResponderExcluirUma boa caminhada, em ritmo acelerado teria sido uma ótima alternativa, quando estava lendo essa parte já pensei que seria a melhor. Enfim, valeu por compartilhar essa aventura.