Aventuras Russas VISÃO NOTURNA
Em novembro de 1992, em minha segunda viagem a Moscou, durante o fim de semana, fomos visitar um parque chamado Izmaylovsky. Embora estivesse coberto de neve, havia uma grande feira de todo tipo de produto. Todo tipo mesmo. Incluindo lâmpadas queimadas, como descrito na postagem Aventuras Russas.
Eu estava particularmente
interessado em adquirir um binóculo.
Naquele tempo, a grande diferença cambial fazia com que diversos
produtos de fabricação russa estivessem muito baratos. Binóculos de grande qualidade era um deles.
Fomos percorrendo o parque, parando
onde houvesse algum tipo de objeto que nos interessasse. Eu, em especial, para onde houvesse algo que
parecesse um binóculo. Num certo
momento, enquanto eu estava parado em frente a uma bancada com diversos tipos
de lentes para câmeras fotográficas, surgiu alguém que se aproximou de forma
estranha. Veio por trás de mim e falou,
por cima do meu ombro, com bom inglês (que não era comum naquela época): estou vendo que você tem interesse em ótica,
gostaria de comprar uma visão noturna?
Minha mente entrou em estado
de alarme imediatamente. Eu sabia do que
se tratava. Atualmente, é possível
comprar algum tipo de câmera que “enxerga” à noite, em qualquer grande
shopping. Naquele tempo, entretanto,
visão noturna era um equipamento militar cuja tecnologia poucos países
dominavam. Com certeza, tratava-se de
material roubado do exército russo. Eu
não tinha interesse, absolutamente, em nenhum tipo de material militar,
especialmente um que fosse roubado. Além
do mais, jamais passaria pela alfândega do aeroporto internacional de Moscou
com aquele produto, fosse ele o que fosse.
Nem cheguei a ver do que se
tratava (se era um óculos ou uma câmera), virei para ele e vi que era um rapaz jovem
alto e com uma mochila nas costas. Fui bem
inciso ao dizer: caia fora daqui imediatamente!
Ele nem retrucou, se afastou tranquilamente como se nada tivesse acontecido.
Eu já conhecia a famosa rua Arbat
no centro de Moscou, onde havia uma feira permanente de muamba. Entre outras coisas, se vendia todo tipo de
uniforme militar: jaquetas, quepes, insígnias, medalhas. Eu poderia, tranquilamente me transformar em
um coronel condecorado, se comprasse todas as peças disponíveis. Mas eram peças individuais que seus usuários não
tinham mais necessidade ou interesse e podiam trocar por um punhado de
dólares. Em princípio, não parecia ser
material roubado e muito menos qualquer tipo de armamento.
No episódio do parque Izmaylovsky,
era diferente. Havia ali um perigo iminente. Um equipamento sensível e roubado, disponível
para quem quisesse comprar. Fiquei
bastante tenso em pensar como aquele rapaz havia me seguido e me abordado. Haveria mais deles por ali ? Certamente.
Seria algum tipo de armadilha para descobrir possíveis compradores
? Eu não quis ficar para saber. Tratei de ir embora e nunca mais voltei
naquele lugar.
Quando, no dia do nosso retorno,
vi minha bagagem ser aberta e revirada, na minha frente, na alfândega de saída
do aeroporto, fiquei rindo por dentro.
Podem procurar à vontade, disse eu a mim mesmo. Até o número de latinhas de caviar era
limitado. Mas eu não tinha nada a
esconder. Voltei para casa em paz, com
mais uma lição aprendida.
Se em sua própria terra é
fundamental andar de forma ética, imagine em outras terras. Não vou julgar se aquele povo estava sofrido
e querendo dar o troco em seu governo. Eu
sabia perfeitamente que aquilo não era certo.
O canto da sereia de poder levar vantagem e depois ir embora, não me
cativou de forma alguma. Voltei à Russia
mais 16 vezes e nunca tive nenhum tipo de problema. Se aquilo foi algum tipo de teste, eu
passei. Se foi algum tipo de tentação, superei.
Bem, consegui finalmente comprar meu
binóculo e o tenho até hoje. Sempre que
olho para ele lembro que precisei de algo maior. Uma visão além do alcance.
Como diz em Mateus 10:16 "sejam astutos como as serpentes e sem malícia como as pombas."
ResponderExcluirO seu crescimento pessoal o leva a ter uma visão além do alcance.
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