FELICIDADE PREOCUPADA
O dia em que foram abertas as notas do vestibular do IME (dezembro de 1973), foi de fato inesquecível. Era a coroação de 10 meses de estudo árduo rumo a um objetivo ainda distante e, de certa forma, indefinido. Competindo com centenas de candidatos também preparados, a emoção de ter passado naquele embate era difícil de descrever.
Logo após o término do evento
de divulgação do resultado, fui até a calçada em frente da praia Vermelha (um
cartão postal do Rio de Janeiro e local de filmagem de muitas novelas e
filmes). Enquanto olhava para esse cenário
paradisíaco, com uma sensação de alívio e extrema alegria, percebi que ao meu
lado havia um colega de cursinho. Seu nome
era Ivan (hoje já falecido) e ele também havia passado.
Me aproximei dele e começamos
a conversar (era a primeira vez que eu falava com ele). Então ele disse algo que me chamou a atenção. Esse é o momento mais feliz da minha vida, disse
ele. Fez uma breve pausa e continuou: e
por isso, estou muito preocupado!
Como assim, preocupado ?
perguntei eu. Preocupado com o quê
? Na minha mente eu estava tentando
imaginar algum motivo que pudesse estragar aquele momento. Será que ele estaria com medo de não
conseguir levar o curso? Então, ele
respondeu: de eu não ter mais uma felicidade como essa.
Confesso que, na hora, fiquei um
tanto confuso com a resposta. Nem lembro
o que lhe respondi, mas não via sentido naquilo que acabara de ouvir. Eu estava com 18 anos e, certamente, não tinha
maturidade para uma visão mais aprofundada da vida. Tudo era muito intuitivo até então.
Porque alguém, em vez de aproveitar
um momento de grande vitória e felicidade, estaria pensando que aquele seria o
seu melhor momento e nunca mais teria outro.
Como ele poderia saber disso? Tinha
a mesma idade do que eu e, portanto, toda a vida pela frente. Em vez de pensar em que novas vitórias e
alegrias adviriam, ele se posicionava como daqui pra frente só ladeira abaixo.
Não sabia (nem nunca soube) o
que ele havia vivido até então. Será que
havia tido algum motivo para uma postura tão deprimente? Ele havia estudado no mesmo cursinho
pré-vestibular que eu (que era muito caro).
Eu mesmo só consegui cursá-lo por ter conseguido uma bolsa de estudos e
meu pai chegou a pedir um empréstimo para comprar as apostilas.
Fosse qual fosse a razão, a
postura de Ivan era de felicidade preocupada. Seria algo como: estou muito feliz e
preocupado porque estou feliz e não vou continuar assim pra sempre. Essa postura pessimista ou mesmo doentia só
poderia trazer transtornos desnecessários, pois representava preocupação com
algo simplesmente inexistente. Certamente
isso deve tê-lo acompanhado por toda a vida.
Se eu pudesse voltar àquele
momento, mais de meio século atrás, eu lhe diria para saborear a vitória
daquele momento e que aquele sentimento seria a energia pra os novos desafios
que viriam e para vitórias ainda maiores.
Não são as nossas ideias que
nos fazem otimistas ou pessimistas, mas o otimismo e o pessimismo de origem
fisiológica que fazem as nossas ideias. Miguel Unamuno
Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o teu coração, porque dele procedem as fontes da vida. Provérbios 4:23
Ter cuidado com o que pensamos isto influencia o nosso coração (sentimentos e crenças)
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